Pular para o conteúdo principal

Zilda Arns

Quando cheguei pra trabalhar fiquei sabendo que a D. Zilda Arns tinha morrido no Haiti, em consequência do terremoto que assolou aquele país já tão sofrido.

Fiquei triste. O mundo é cheio, infelizmente, de maus exemplos e más notícias o tempo todo. Concordo com quem diz que as coisas boas acabam sendo escondidas, pouco divulgadas.

O trabalho da D. Zilda era uma das raras exceções. Gostava dela, do sorriso permanente no seu rosto - aliás, a família Arns inteira tem a mesma carinha, né? rsrs - e da sua delicadeza de modos e no falar.

Que Deus a abençoe.

Resolvi colar aqui parte de uma entrevista dela que encontrei no site da revista Época em junho de 2008 onde ela fala, principalmente, da Pastoral da Criança. Para quem quiser lê-la na íntegra, tá aqui.

A pediatra Zilda Arns recebeu vários prêmios internacionais por seu trabalho de mais de duas décadas com a Pastoral da Criança. Desde 1993, ela também coordena a Pastoral da Pessoa Idosa, que atende mais de 100 mil idosos. Com sua atuação social, Zilda firmou-se não só como símbolo de generosidade cristã, mas como um exemplo de como é possível construir projetos eficientes e longevos. Nesta entrevista, ela fala sobre os elementos fundamentais de uma ação que pretende mudar o país.

QUEM É: Viúva e mãe de cinco filhos, tem 73 anos. Nascida em Forquilhinha, Santa Catarina, tem 12 irmãos. Cinco deles seguiram a vida religiosa, entre eles o arcebispo emérito de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns.

O QUE FEZ: Pediatra e sanitarista, é fundadora das Pastorais da Criança e da Pessoa Idosa, programas sociais que já ajudaram mais de 2 milhões de pessoas



Como despertar a generosidade nas pessoas?Marianna Costa, Vitória, ES
Zilda Arns – Com educação, que deve ser dada de forma integral. Não educar só para as matérias acadêmicas, mas também para os valores culturais, como a amizade, a responsabilidade e a esperança. A primeira infância é onde se fixam os valores culturais muito fortemente. Se a mãe gestante amamenta o filho, acaricia-o, canta, reza, demonstra seu afeto, a criança se cria para a fraternidade e o amor. Ela aprende a conviver. Há uma pesquisa da Organização Mundial da Saúde que associa os maus tratos a crianças menores de um ano à violência e criminalidade. Temos de educar a família para cuidar muito bem do primeiro ano de vida. Tratar bem deste período é fundamental para a mudar o quadro do Brasil. Devemos também ensinar que as crianças têm obrigações na vida. A melhor forma é promover o esporte, a música e as artes. Essas atividades ensinam à criança que ela não pode fazer o que vem à cabeça. É preciso seguir as regras para ganhar. A criança se educa para os limites. Ela aprende a jogar junto, a ganhar, a perder. Estas atividades as fazem entender o valor do esforço.

Como a senhora teve a idéia de criar a Pastoral da Criança? Simone Neckel, Itapiranga, SC
Zilda – A Pastoral nasceu quando meu irmão Don Paulo (Evaristo Arns, arcebispo emérito de São Paulo) me telefonou em 1982 e contou uma conversa com o então Secretário Executivo do Unicef, James Grant. Grant disse a ele que a Igreja poderia salvar milhões de crianças se ensinasse a preparar o soro caseiro. Na época eu estava muito influenciada por uma ata da Organização Mundial da Saúde que pregava a descentralização dos serviços de saúde. Fiquei entusiasmada após Don Paulo me contar a sugestão do secretário e passei a noite imaginando como criar uma ação social que tivesse como foco a ação na comunidade. No dia seguinte, Grant ligou para o Unicef pedindo que me chamassem na sede da entidade em Brasília. Mostrei meu projeto e eles ficaram animadíssimos. Por coincidência, estava acontecendo em Brasília a reunião do Conselho Permanente da CNBB. Fui falar com os membros e eles concordaram em apoiar o trabalho. Começaria apenas na Diocese de Florestópolis, Paraná, porque a Igreja não estava acostumada a lidar com trabalhos sociais como este. Depois de um ano, os resultados vieram e comprovaram o sucesso do projeto. De 127 mortes por cada grupo de mil crianças, a taxa de mortalidade passou para 28 por mil.

Como é a atuação da Pastoral da Criança? Antônio Sebastião Neto, Uberaba, MG
Zilda – A Pastoral segue a metodologia que Jesus usou para repartir os peixes e os pães. A distribuição dos alimentos foi realizada entre pequenos grupos. Assim também faz a Pastoral. Em segundo lugar, como disseram os discípulos: “Dai-vos a vós mesmos de comer”. Em vez de pães e peixes, ensinamos às famílias e aos líderes comunitários os cuidados básicos para a prevenção de problemas. É a multiplicação das informações e da fraternidade. Jesus também pergunta, no Evangelho, se todos estavam satisfeitos. Isso representa um sistema de informação que retorna à comunidade com outros conhecimentos e estímulos. A Pastoral faz com que a comunidade seja capaz de cuidar de si própria por meio da multiplicação dos conhecimentos e dos cuidados básicos de saúde, higiene e alimentação.

Qual o papel da mulher para o Brasil do século 21. Maria Clara Fonseca, Campo Grande, MS
Zilda - O papel da mulher é essencial. Em primeiro lugar porque ela tem a primeira infância (de 0 a 6 anos) nas mãos, e primeira infância é a base da estruturação da vida de uma pessoa. Em segundo lugar, porque a mulher tem uma visão difusa. Ela tem uma visão social coletiva, enxerga a necessidade da oportunidade para todos. As mulheres são mais firmes nas políticas públicas, lutam por elas, se atiram. Já os homens são cautelosos. Para ilustrar, temos mais de 270 mil voluntários na Pastoral da Criança só no Brasil. Destes, 92% são mulheres. Elas interferem na comunidade e se sentem bem atuando como voluntárias. Se nós educamos uma mulher, educamos gerações inteiras. E hoje temos pesquisas que demonstram que quando a mulher é analfabeta, a mortalidade infantil é de 90 por mil. Se ela tiver até quatro anos de ensino, a taxa já diminui para 70 por mil, e assim por diante. A educação da mulher, portanto, é capaz de transformar não só a vida dela, mas a da família. A mulher tem o poder de melhorar os indicadores sociais do Brasil.

Que mensagem a senhora deixa para aquelas pessoas que ainda não perceberam que a colaboração pode mudar a sua comunidade, seu bairro ou município? Marlúzia Maria Pessoa, Natal, RN
Zilda - Quem doa para uma entidade séria, pode estar seguro do bom emprego de sua doação. Essa pessoa está contribuindo para a mudança social, para um mundo mais justo a serviço da vida e da esperança. Voluntariado é tão bem-vindo quanto doações. Os voluntários participam das transformações e se transformam eles próprios, passam a ver o mundo de outra maneira. Não se enganem, uma gotinha no oceano faz, sim, muita diferença.

Comentários

  1. You can gradually decrease the consumption of calories
    in order not to slow down the metabolism. This kind of diet is
    considered by doctors and nutrition experts as being the most
    dangerous way to get rid of the extra pounds.
    How to get skinny fast is not about quick weight loss diets and your calorie count, it is
    about proper eating and proper exercise.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Séries: Reunion

Você se sentiria empolgado pra ver uma série previamente sabendo que ela foi cancelada e não teve um final? Então, eu faço dessas. Ou melhor, fiz pela primeira vez, e com Reunion. E, no geral, valeu a pena. A série foi transmitida originalmente nos EUA entre 2005 e 2006. Foram filmados 13 episódios mas só 9 passaram por lá, sendo que os outros 4 foram transmitidos nos países que, posteriormente, compraram a série. A história começa em 1986, com a formatura do ensino médio de seis amigos inseparáveis. Ao mesmo tempo, é mostrado que, em 2005, um dos amigos foi assassinado - quem? Só saberemos no capítulo 5, de forma surpreendente - e os outros cinco amigos são suspeitos. Cada episódio tem como título um ano - foram de 1986 a 1998 - e vamos vendo como anda a amizade dos seis, algumas vezes se tornando mais forte, em outras parecendo regredir. Eu achei muito bacana não ser revelado de cara quem morreu. Vamos vendo, em cada episódio, um dos amigos vivos aparecer nos temp

A noite em que os hotéis estavam cheios - Moacyr Scliar

(3ª postagem do dia) O casal chegou à cidade tarde da noite. Estavam cansados da viagem; ela, grávida, não se sentia bem. Foram procurar um lugar onde passar a noite. Hotel, hospedaria, qualquer coisa serviria, desde que não fosse muito caro. Não seria fácil, como eles logo descobriram. No primeiro hotel o gerente, homem de maus modos, foi logo dizendo que não havia lugar. No segundo, o encarregado da portaria olhou com desconfiança o casal e resolveu pedir documentos. O homem disse que não tinha, na pressa da viagem esquecera os documentos. — E como pretende o senhor conseguir um lugar num hotel, se não tem documentos? — disse o encarregado. — Eu nem sei se o senhor vai pagar a conta ou não! O viajante não disse nada. Tomou a esposa pelo braço e seguiu adiante. No terceiro hotel também não havia vaga. No quarto — que era mais uma modesta hospedaria — havia, mas o dono desconfiou do casal e resolveu dizer que o estabelecimento estava lotado. Contudo, para não ficar mal, resolveu dar um

Poema XX - Pablo Neruda

Pablo Neruda é, acredito, o poeta hispano-americano mais conhecido no Brasil, seja por sua poesia, seja pelo filme O carteiro e o poeta . Seu livro mais conhecido, Veinte poemas de amor y una canción desesperada, foi publicado quando ele tinha só 20 anos e hoje lemos o último poema de amor, o XX, na aula de Literatura Hispano-Americana. Éramos poucos na sala e terminamos a leitura comovidos. A Vikki disse que se houvesse mais dois versos ela teria chorado e não foi exagero. Quem nunca perdeu um amor? Quem não sabe como isso realmente dói? "Puedo escribir los versos más tristes esta noche. Escribir, por ejemplo: 'La noche está estrellada, y tiritan, azules, los astros, a lo lejos.' El viento de la noche gira en el cielo y canta. Puedo escribir los versos más tristes esta noche. Yo la quise, y a veces ella también me quiso. En las noches como ésta la tuve entre mis brazos. La besé tantas veces bajo el cielo infinito. Ella me quiso, a veces yo también la quería. Cómo no habe